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A Proposta de Emenda Constitucional 241, que se tornou
conhecida nacionalmente como a PEC-241, reflete o absoluto distanciamento da
tecnocracia neoliberal que decidiu impô-la ao Congresso Nacional, e em
particular ao Senado da República, da realidade crua da cidadania brasileira.
Não falo apenas de números. Falo de conceitos. Quem propôs essa PEC não tem a
mais elementar ideia do que seja o relacionamento fundamentalmente articulado
entre orçamento público e o conjunto da economia. Em uma palavra, entre o gasto
público e o crescimento da economia.
Na realidade, recorrendo a uma metáfora realista, o
orçamento público é como o coração no corpo humano: dele saem as energias
centrais que põem todos os órgãos e membros em movimento. Impedir o coração de injetar permanentemente
sangue novo no corpo é condenar o corpo a ser consumido aos poucos pela
gangrena. Isso está acima de ideologias. São fatos. Seja estado máximo ou
estado mínimo, é o estado, através do orçamento, o único agente, por exemplo,
que, numa recessão, pode fazer aumentar a demanda efetiva e o investimento,
inclusive privado.
Sabemos disso pela economia keynesiana. Foi sob inspiração
de Keynes que os países ocidentais viveram o que se consagrou como a Idade de
Ouro do capitalismo no pós-guerra. Nela o estado, através do orçamento,
desempenhou papel da mais absoluta centralidade. Em alguns países, como os do
norte europeu, de elevadíssima condição de bem-estar social, o orçamento
público – ou seja, os impostos – alcançou mais de 60% do PIB, ou seja,
praticamente o dobro daquilo que a Fiesp reclama como excesso. A partir dos
anos 80, regrediu na Europa o papel do Estado e prosperou a especulação
financeira estéril.
A PEC-241 traz evidentes ameaças ao custeio de funções
essenciais do Estado, mas, do ponto de vista econômico, ela consegue ser ainda
mais prejudicial. Os investimentos públicos serão virtualmente extintos no
plano federal. Com eles, suas articulações estaduais e municipais sofrerão
consequências inevitáveis. Quando o estado elimina, por exemplo, o aumento do
investimento em construção habitacional ele está congelando imediatamente parte
ou todo o investimento em materiais de construção, de cimento, madeira, móveis
a tijolo, nos estados federados e nos municípios.
Espanta-me, senhoras e senhores senadores, que uma
iniciativa de caráter tão grotesco possa ser trazida para discussão no Senado
Federal em plena depressão econômica, a maior da história da República.
Esqueçamos por um momento o interesse público mais geral. Falemos dos
interesses das populações dos estados federados, ou dos municípios. Aqui neste
plenário há muitos senadores e senadoras que aspiram, legitimamente, governar
os seus estados. Ai deles. Se a PEC-241 passar não governarão a não ser um
espólio endividado e condenado à estagnação.
Não creio, sinceramente, que haja uma inteligência coerente
por trás desta e de outras iniciativas do governo relacionadas com os estados
federados. A renegociação das dívidas nos termos propostos é uma farsa. Falarei
sobre ela oportunamente. Também é uma farsa o projeto de privatização da parte
já negociada da dívida ativa dos estados, na medida em que estimula o deságio
sobre supostos ganhos atuais e subtrai impostos certos que seriam recolhidos,
sem deságio, por administrações futuras. Mais uma vez, jogando o presente
contra o futuro.
Não entendo a lógica dessas e de outras propostas. Na
verdade, elas assinalam a ausência de plano, de estratégia e definição de
objetivos coerentes pelo governo. Numa palavra, com o impeachment, saímos de um
governo fraco para governo nenhum, ou para um governo desarranjado e mutilado.
Aparentemente, o único objetivo deste governo é se manter no poder, a qualquer
custo. E mesmo isso é uma dúvida, na medida em que há claras fissuras nos partidos
que haviam se comprometido a lhe dar sustentação. Alguns claramente estão dando
sinais de cansaço, exceto na Câmara de Eduardo Cunha.
Peço às senhoras e
senhores senadores que reflitam detidamente sobre a PEC-241. Ela não serve para
o Brasil. Consultem especialistas independentes, cidadãos imparciais, pessoas
comprometidas realmente com os interesses nacionais. Todos lhes dirão que ela
não serve para o Brasil e para nenhum outro país no mundo, em especial países
em desenvolvimento, que precisam desesperadamente de investimentos públicos. Os
que propuseram essa PEC-241 ao Executivo, fazendo com que ela fosse aprovada na
Câmara, não tem compromissos com o Brasil. O Senado, numa plataforma
suprapartidária, deve dizer isso à Nação.
[1] Roberto Requião é Senador da República no segundo
mandato. Foi governador do Paraná por três mandatos, prefeito de Curitiba e
deputado estadual. É graduado em direito e jornalismo com pós-graduação em
urbanismo e comunicação.
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