quinta-feira, 1 de março de 2012

Projeto que altera padrão de construções condena Belém ao caos

Deu no Blog do Prof. Fabio Castro

Mais uma do vereador Gervásio Morgado: um projeto de sua autoria propõe aumentar o gabarito para construções ao longo da av. Almirante Barroso, chegando até o entorno do chamado Entroncamento - o bairro da Cabanagem, para o modelo M16. Isso significa incentivar a construção de prédios de escritórios,  hipermercados, e shopping centers, permitindo construir três vezes a área de cada terreno. Assim, dependendo da forma e da área do lote, poderiam ser erguidos prédios de até 40 pavimentos ou com 30 mil m² de área construída.

Pode-se imaginar o caos que seria causado pela aprovação desse projeto numa área já caótica em termos de mobilidade e acessibilidade urbana. Trata-se, afinal, do principal nó urbano da cidade, uma área sem calçadas, ciclovias, passarelas ou estacionamento

Essa área, como se sabe, já possui um grande número de empreendimentos de comércio e serviços: feiras, centros de abastecimento, centros comerciais e outros. Se nada disso incentiva o poder público a agir, de maneira propositiva e responsável (nem projeto se tem...) imaginem como não ficará Belém se o trânsito pesado, de carretas e caminhões, for multiplicado nesse pedaço já maluco de Belém.

A proposta fere o disposto na Lei 8.655/2008 (Plano Diretor Urbano de Belém).

No Facebook, corre uma petição pública, já protocolada na Câmara Municipal de Belém, alertando sobre as irregularidades do projeto de sua autoria aumentando o gabarito para construções no Entroncamento, bairro mais crítico no trânsito de Belém. 

Um comentário:

Anônimo disse...

Reproduzo aqui o oportuno artigo da Geógrafa Milene Lauande que trata das alterações do Plano Diretor Urbano de Belém propostas pelo Vereador Gervásio Morgado (PR)


Jogo de forças


Milene Lauande*

O projeto de lei de autoria do vereador Gervásio Morgado (PR) que altera dispositivo da lei 8655/2008 (Plano Diretor Urbano de Belém) para aumentar o gabarito de construções na complicada área do Entroncamento trouxe à tona um antigo e necessário debate acerca do lobby do setor das incorporadoras e construtoras no Legislativo e Executivo. Tema tão polêmico quanto necessário para discutirmos o projeto de cidade que queremos para Belém às vésperas de completar 400 anos e de eleger o próximo prefeito.

O direito de usufruto pleno da cidade em uma sociedade capitalista é um jogo de forças, contradições e conflitos, onde geralmente a população de baixa renda tem suas propostas rejeitadas. Mas como toda regra, há exceções.

O lobby empresarial do ramo da construção civil, quer seja de incorporadoras, quer de construtoras, não é fato recente na história legislativa da cidade de Belém. Em 1991 quando foi debatido na CMB o primeiro Plano Diretor Urbano, ficou muito clara a divisão entre os diferentes atores sociais.

Os vereadores na época se depararam com a questão do padrão construtivo (instrumento urbanístico de frear a verticalização nas cidades). Isso foi motivo de grande debate e opôs de um lado a sociedade civil organizada defendendo um índice de 1.0 e de outro as construtoras e incorporadoras que queriam um padrão construtivo de 2.0.

Destaco que a Câmara sempre foi um palco privilegiado de interesses no que se refere à verticalização da cidade. Já naquela época, os legisladores mediaram o conflito das duas posições antagônicas. Os movimentos sociais não se intimidaram diante da força da especulação imobiliária e conseguiram aprovar o índice de aproveitamento de 1.4. Então, temos que este processo é permanente, já que desde 1991 este padrão já foi alterado algumas vezes, via de regra, com participação ativa do setor especulativo e sem nenhum canal de participação popular e controle social como quer agora o vereador Morgado.

Na realidade estamos falando é do índice de aproveitamento que faz parte do solo criado, diretamente ligado à verticalização da cidade, ao estabelecer um coeficiente construtivo básico. O processo especulativo tornou-se um grande problema para Belém, pois implica na elevação do preço da terra e impede o acesso das famílias de baixa renda à moradia criando renda fundiária; ou seja, a especulação com a terra urbana, segrega espacialmente a população de baixa renda.

A área abrangida pelo projeto do vereador é uma área de expansão da cidade, além da primeira légua patrimonial, é atualmente o objeto de cobiça dos insaciáveis apropriadores do espaço público, dado o “esgotamento” das áreas centrais.

Então, louvo a reação da sociedade civil, inclusive via redes sociais, em discutir este importante tema e não permitir que se aprove a mudança de forma anti-democrácita e em desacordo com o controle social previsto no Estatuto da Cidade. Pois não devemos nunca perder de vista que o espaço da cidade é um cenário de lutas sociais onde pode se negar ou assegurar a cidadania.

O lobby legítimo da sociedade civil organizada, quando bem encampado, pode sim resultar em ganhos. O caso da reversão da mudança do nome da Tv.Apinagés para homenagear um empresário é um grande exemplo.

*Professora da rede estadual de ensino, Geógrafa e Mestra em planejamento do desenvolvimento (NAEA/UFPA)