“Seus olhos embotados de cimento e lágrimas” (Da música
Construção de Chico Buarque).
É como se essa frase houvesse previsto a trágica cena que correu
o mundo, minutos depois de um silo, com toneladas de concreto, desabar,
literalmente, sobre a vida de três operários nas obras da usina hidrelétrica de
Belo Monte. Nesse vídeo, operários lavavam, da cabeça aos pés, um jovem
trabalhador que, atordoado, escapara com vida e completamente encoberto pelo
concreto que matou três de seus companheiros de ofício.
Essa chaga aberta, na madrugada de sábado, 31 de maio de 2015,
provoca dor, angústia, desalento e desesperança nos familiares das vítimas.
Eram ajudantes de produção, dois deles com cerca de 20 anos de idade e o terceiro
com pouco mais de 40 anos de idade. Sonhos foram interrompidos; O clima
fúnebre, certamente, paira no ar amazônico e deve ter ganhado peso nas noites
dos alojamentos e no canteiro que não para, mesmo diante de vidas ceifadas.
Como diz um poema: “Há homens de pensamento, não sabereis nunca
o quanto, aquele humilde operário soube naquele momento”; É o que imagino ter
passado na cabeça daquele jovem das imagens. Frente à essa tragédia, além da
mais profunda e necessária solidariedade às famílias desses trabalhadores,
confesso que me vem muitas outras imagens que indignam. Ali se trabalha sob à presença de forças
armadas (a Força Nacional de Segurança) mantida pelo governo federal, dali só
se sai pra visitar as famílias, na pratica, a cada 180 dias; Um canteiro que,
em busca de vida, morre-se a cada instante e há instantes em que se morre
assim, tão “concretamente”.
Uma obra que, mesmo contestada “nos quatro cantos do mundo”,
impõem-se pelos mandos do governo petista; Uma chaga que “rasga o rosto da
terra”, obstrui o curso do rio e joga, quase à míngua, centenas e até milhares
de ribeirinhos, pescadores, mulheres e homens nativos, enquanto as “monetárias
mãos” das empreiteiras, cinco delas (Odebrecht, OAS, Camargo Corrêa, Queiroz
Galvão e...) envolvidas nas investigações da “Operação Ava Jato”, esquema de
corrupção da Petrobrás, receberão o dobro (30 bilhões) do orçamento inicial da
mesma.
Contrariando o otimismo e a ironia da composição paraense, eis
um dia em que “Norte” escreveu-se com “M”. Cabe a nós trabalhadores honrar os
que tombam na labuta, tomar as suas esperanças em nossas mãos, afagar-lhes a
alma em nossa unidade, em nossa capacidade transformadora e na obra de nossa
luta! Somos nós, a classe trabalhadora, que, como a força da correnteza Xingu,
prensaremos os que põem o lucro a cima da vida até transbordarmos um novo
destino; O da liberdade, o do fim da exploração.
* Dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Belém e da CSP Conlutas
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