quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

2018: nuvens negras sobre a América Latina – por Vicky Peláez


ENQUANTO A GEOPOLÍTICA MUNDIAL se reorienta cada vez mais para a multipolaridade, a América Latina está tomando um curso oposto. Tal retrocesso é impulsionado pela submissão e a corrupção de suas elites e os meios de comunicação globalizados a serviço do sistema financeiro estadunidense.

Por Vicky Peláez (jornalista peruana) – do portal Nodal – Notícias da América Latina e Caribe, de 12/01/2018 – Tradução: Jadson Oliveira (os intertítulos foram adotados nesta edição)

Tal curso está impulsionado pela submissão, a corrupção de suas elites e os meios de comunicação globalizados a serviço do sistema financeiro norte-americano, que precisa manter os latino-americanos e seus imensos recursos naturais em seu ‘quintal’ para assegurar seu próprio bem-estar econômico.
Para desmantelar a ‘pluripolaridade’ no Hemisfério Ocidental, promovida por Hugo Chávez, Rafael Correa, Evo Morales e Daniel Ortega, Washington não economizou recursos financeiros com a finalidade de comprar e corromper os oligarcas, banqueiros locais, os burocratas governamentais, a classe média alta, dirigentes indígenas e os donos dos meios de comunicação, que conseguiram garantir a permanência ou o retorno do neoliberalismo radical a seus países.
Atualmente, nações como Honduras, Guatemala, México, Paraguai, Chile, Colômbia, Peru, Argentina e Brasil estão governadas pela direita radical de tendência neoliberal disposta a obedecer cegamente os ditames e instruções de Washington.
Seus governos representam precisamente a variante da América Latina descrita pelo próprio presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, como “um cachorro simpático que está dormindo no tapete e não causa nenhum problema” aos EUA.
O processo de retorno forçado dos países que se atreveram a se afastar da órbita de Washington e declararam sua soberania foi impulsionado por Barack Obama e Hillary Clinton, que orquestraram e dirigiram em 2009 um ‘golpe de Estado constitucional’ contra o presidente legitimamente eleito de Honduras, Manuel Zelaya. Depois, em 2012, a CIA e o Departamento de Estado promoveram um ‘golpe parlamentar expresso’ contra o presidente paraguaio, ex-bispo católico e partidário da ‘teologia da libertação’ Fernando Lugo.
Anos antes houve também intentos fracassados de golpe na Venezuela (2002) contra Hugo Chávez e na Bolívia, em 2010, contra Evo Morales. Neste mesmo ano Washington financiou uma rebelião policial contra Rafael Correa no Equador, mas não conseguiu seu propósito. Apesar destes fracassos, a Casa Branca não ficou com as mãos cruzadas e prossegue, com mais intensidade e dinheiro, sua guerra midiática suja na América Latina.
Argentina
Conseguiu convencer os argentinos de que o governo de Cristina Fernández era o mais corrupto do continente e freava o desenvolvimento do país, afastando-o do capital estrangeiro e, em especial, do estadunidense. Criando uma imagem negativa do governo de Fernández, a direita logrou impor seu candidato, Mauricio Macri, e elevá-lo à Presidência.
O que se seguiu foi um retorno ao passado, quando os ricos se enriqueceram mais à custa da classe média e dos mais pobres. A privatização das empresas públicas e a desregulação da economia abriram o caminho ao domínio das transnacionais e, finalmente, à instalação da base militar norte-americana na Tríplice Fronteira, um velho anseio do Pentágono. O empobrecimento massivo do país não importa ao governo e as marchas de protesto quase diárias vêm sendo reprimidas com dureza.
Brasil
No Brasil, a destituição da presidenta Dilma Rousseff em 2016 seguiu o mesmo roteiro que utilizaram para o golpe de Estado contra Fernando Lugo no Paraguai. Inclusive o Congresso brasileiro contratou o serviço da mesma empresa da direitista ex-secretária de Estado, Madeleine Albright (Albright Stonebridge Group), para ajudar a fazer um ‘golpe parlamentar’ contra Rousseff.
O novo presidente, Michel Temer, colocou em marcha um programa econômico no mesmo estilo de Mauricio Macri e desmantelou o setor público, congelou os salários por 20 anos e, o mais importante, deu permissão aos estadunidenses para instalar uma base militar na Amazônia. E, ainda, não defendeu uma das mais importantes corporações do setor industrial militar, Odebrecht, e fez congelar o desenvolvimento da indústria nuclear no país que estava sob o encargo desta companhia.
Venezuela
Já dura 19 anos a guerra midiática, financeira, diplomática e econômica que o governo dos Estados Unidos empreende contra a Venezuela que, sob a liderança de Hugo Chávez, primeiro, e depois de Nicolás Maduro, tem seguido um curso progressista, opondo-se à política intervencionista de Washington e conseguindo ir adiante, apesar de guarimbas e outras formas de violência política propiciada pela oposição que é guiada pela América do Norte.
Agora a situação se acalmou devido ao debilitamento da oposição e o fortalecimento do chavismo. Entretanto, as drásticas sanções estadunidenses, a estocagem dos produtos de primeira necessidade e a sabotagem econômica incessante prejudicam o chavismo. Atualmente, o país sofre a escassez de gasolina porque a Pdvsa (estatal do petróleo) carece de aditivos necessários para a refinação, que não chegam como antes dos EUA devido às sanções.
Ademais, 100.000 barris diários de gasolina escapam para a Colômbia, Aruba e Curaçau. Ultimamente, depois de 338 chamados de Nicolás Maduro à oposição para entabular um diálogo, há uma remota possibilidade nos próximos dias11 e 12 de janeiro para conseguir um entendimento e deter a sabotagem econômica.
Peru
Peru, sob o mando de Pedro Pablo Kuczynski, se converteu não somente no ‘cachorrinho dócil’ de Washington, mas também no refém do fujimorismo, com quem Kuczynski fez um pacto para evitar ser destituído por corrupção em troca de indultar o ex-ditador Alberto Fujimori, que purgava cárcere por delitos de lesa humanidade. Em consequência disto, o país, polarizado, se encontra em constante mobilização e se vem organizando a nível nacional uma nova proposta de vacância presidencial. Igualmente, os diferentes segmentos estão chegando até tribunais internacionais para anular o indulto a Alberto Fujimori, que se achava ‘à beira da morte’, mas agora, em liberdade, vem dando opiniões com muita energia e pedindo ‘trabalhar unidos por um país sem violência’. Todo o país contempla admirado como o moribundo indultado defende seu filho Kenji Fujimori, que pretende chegar à Presidência do país.
Uruguai e Equador
Em outros países, como o Uruguai, a orientação política da nação está se deslocando da centro-esquerda para a centro-direita sob a liderança de Tabaré Vázquez. O presidente Vázquez trata de ‘ordenar’ a herança deixada por Pepe Mujica. Algo similar está ocorrendo no Equador, onde o presidente Lenín Moreno está se esforçando para desfazer a herança de Rafael Correa.
Primeiro, acabou com os meios públicos de comunicação, convertendo o diário polêmico e alternativo El Telégrafo em algo amorfo. Depois, segundo o jornalista Jaime Galarza, fez prisioneiro seu vice-presidente, Jorge Glas, eleito em 2 de abril passado por milhões de equatorianos, por não estar de acordo com sua política de aproximação com a direita.
Assim se conseguiu “armar um circo implacável de múltiplos poderes locais e internacionais, entre eles o Departamento de Justiça dos EUA, esse pântano de lagartos insaciáveis, magistrados de leitura rápida (100 expedientes por dia), linchadores midiáticos que atuam full time, parlamentares convertidos em tais por milagre, banqueiros nostálgicos de célebres feriados (golpes fiscais), líderes esquerdistas que dançam abraçados a múmias direitistas, todos pedindo a forca para Glas”, descreve Galarza (28/12/2017).
Cuba
Em Cuba vêm muitas mudanças. Primeiro, os prognósticos de todos os especialistas, a nível mundial, sobre o crescimento negativo em 2017 não se cumpriram e a economia do país cresceu 1,6%. Segundo, apesar do furacão Irma, das sanções estadunidenses e do problema da disponibilidade de combustível, Havana seguiu adiante com seus planos de desenvolvimento social e a indústria do turismo continuou crescendo. A ilha caribenha foi visitada por 4,7 milhões de pessoas. Este 2018 começou com uma excelente notícia, quando a delegação da União Europeia condenou o bloqueio econômico, comercial e financeiro contra Cuba por parte dos EUA e o tachou de obsoleto e ilegal.
Com isto, praticamente a UE reconheceu a legalidade da Revolução Cubana. As duas partes firmaram um acordo de diálogo político e cooperação econômica no valor de 58 milhões de euros — 69,6 milhões de dólares. Isto coincide com o anúncio de Raúl Castro de deixar o poder em abril deste ano.
México e Honduras
No México haverá surpresas em 1º. de julho quando ocorrerão as eleições presidenciais. Segundo as pesquisas do instituto Latinobarómetro, o candidato esquerdista Andrés López Obrador tem a aprovação de 30% dos mexicanos, enquanto o candidato do governo, José Antonio Meade, tem 23%. No entanto, os meios de comunicação globalizados já começaram a guerra contra López Obrador, declarando que, com ele, “o México se converterá numa nova Venezuela”.
Não é a primeira vez que isto acontece: López Obrador foi o favorito em 2006, mas o sistema não deixou que ele chegasse ao poder e ‘perdeu’ as eleições por 0,7% dos votos, ante a denúncia e protesto generalizado, tal como ocorre hoje em Honduras onde o favorito das pesquisas, Salvador Nasralla, foi derrotado pelo presidente candidato, Juan Orlando Hernández.
Lula
Neste 2018 haverá eleições em seis países. Costa Rica (fevereiro), Paraguai (abril), Colômbia (maio), México (julho), Venezuela (novembro) e Brasil (outubro). Tal como vão as coisas, os candidatos apoiados pelos EUA, para que o continente continue sendo seu ‘quintal’, têm maior chance de ganhar e até são impostos.
No Brasil, por exemplo, o candidato favorito, de prestígio internacional, Luiz Inácio Lula da Silva, corre o risco de ser encarcerado por um caso de corrupção — não comprovado — para evitar que concorra às eleições.
Entretanto, tudo neste mundo está em permanente movimento. A outrora poderosa Europa está deixando de ser um dos importantes centros da globalização e se debilita. Ganha força lentamente um mundo multipolar que se distancia da ideologia ocidental. Por sua vez, a direita radical que agora se apodera da América Latina agudizará as contradições na sociedade moderna, onde a internet, WhatsApp, etc. já tiraram a exclusividade da verdade das mãos dos meios de comunicação globalizados. Então, tudo é questão de tempo até que surja um novo ciclo de desenvolvimento mais progressista, forte e justo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Vaaai nessa!

Queriam tornar a América Latina num bloco comunista. Não seja tolo, estamos perdendo nossa liberdade aos poucos. Veja a Bolívia, veja a Venezuela, veja o Brasil onde nem podemos sair de casa direito, não podemos abrir um empreendimento sem o governo querer 50% do nosso trabalho.

É esse o modelo que realmente desejas? Ainda vais acreditar na narrativa histórica dos universitários da UFPA?