Elogiado por Bolsonaro, Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) é alvo de denúncias de improbidade que pedem devolução de R$ 16 milhões por suspeita de favorecimento a fornecedor que não entregou serviço.
Quando foi idealizado em 2008, o Gerenciamento de Informações Integradas da Saúde (Gisa) prometia criar o prontuário eletrônico de pacientes de postos e hospitais públicos de Campo Grande, inclusive com a marcação de consultas por telefone. O programa seria uma revolução, onde médicos poderiam acessar, em questão de segundos, dados de saúde e de tratamentos dos usuários do SUS na capital de Mato Grosso do Sul.
Dez anos depois, o Gisa tem como únicos resultados concretos duas denúncias de improbidade administrativa que tentam recuperar R$ 16 milhões (valores corrigidos) gastos pelo Ministério da Saúde e pelo município. Ele nunca saiu do papel.
O responsável pelo Gisa – e alvo da Procuradoria que apura desde fraude em licitação a favores ilegais do fornecedor – é o deputado Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS), ex-secretário municipal e favorito para assumir o Ministério da Saúde no governo Bolsonaro.
Mandetta teve os sigilos bancário e fiscal quebrados e está com os bens bloqueados há cinco anos. A Procuradoria afirma que o fornecedor, que não entregou o serviço, pagou uma viagem do então secretário a Portugal e teria bancado ainda despesas de Mandetta com a locação de avião privado durante a campanha eleitoral de 2010, quando ele foi eleito deputado federal pela primeira vez.
Nesta terça, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, reforçou a condição de favorito de Mandetta, elogiando-o: "Ele é muito benquisto pelos médicos de todo o Brasil, a Frente Parlamentar da Saúde é simpática a ele, que deixou um rastro de bons serviços lá em Mato Grosso do Sul."
A informatização dos prontuários em nível nacional é uma das promessas de Bolsonaro.
O rastro de mau uso do dinheiro público no Gisa, com suspeita de fraude, começou a aparecer em uma sindicância da Prefeitura de Campo Grande em 2013, depois que o grupo de Nelson Trad Filho (PTB-MS), primo de Mandetta, deixou a prefeitura.
A sindicância sobre o Gisa, que reuniu oito volumes de documentos, foi o ponto de partida para uma investigação do Ministério Público Federal. Em 2015, a Procuradoria apresentou as denúncias, mas até hoje elas não foram analisadas pela Justiça.
Primeiro, subiram ao STF porque o deputado do DEM tem prerrogativa de foro, e, este ano, retornaram à primeira instância porque os fatos se deram antes de ele ter sido eleito para o Congresso. Os bens dele e de outros suspeitos foram bloqueados em 2013 por meio de medida cautelar (provisória).
De acordo com o Ministério Público Federal, houve favorecimento no edital para a implantação do programa ao consórcio liderado pela empresa Telemidia & Technology International Comércio e Serviços de Tecnologia Ltda.
Segundo a investigação, a empresa teve acesso às regras da licitação, antes mesmo do edital ser publicado. Um dos indícios de fraude é que o orçamento apresentado pela empresa na licitação era exatamente igual ao montante de verba repassada pelo Ministério da Saúde, que já estava disponível pela Prefeitura de Campo Grande, naquele ano: R$ 8,1 milhões.
Outros concorrentes também foram desabilitados. A denúncia afirma que a cláusulas restritivas limitaram a concorrência e a Telemidia venceu e assinou o contrato com a prefeitura, mesmo sem preencher requisitos do edital e até de ter apresentado documentação falsa. Logo depois de assinar o contrato, a Telemidia subcontratou a empresa portuguesa Alert, embora o edital vetasse a terceirização.
Segundo a Procuradoria, foi a Telemidia que pagou uma viagem de Mandetta a Portugal, em 2010, onde ele se encontrou com executivos da Alert. Menos da metade do serviço pago pela Prefeitura de Campo Grande foi entregue pela Telemidia/Alert. Dos 12 módulos previstos no Gisa, somente dois tinham sido entregues plenamente em 2015 e outros dois de forma parcial. O programa acabou engavetado.
A versão de Mandetta
O BuzzFeed News não conseguiu falar com Mandetta. Em ocasiões passadas, o deputado disse que o Gisa não ficou operacional por causa de briga política com o prefeito Alcides Bernal, que sucedeu Trad na Prefeitura. Ele nega que tenha favorecido ou sido favorecido pela empresa contratada.
Mandetta disse ao jornal Folha de S.Paulo que informou o presidente Jair Bolsonaro que existem as ações de improbidade, mas que não é réu porque a Justiça. Segundo ele, o presidente teria dito: “Pô, você ficou seis anos numa secretaria de saúde e tem só um processo?”
Graciliano Rocha é Editor de Notícias do BuzzFeed e trabalha em São Paulo. Entre em contato com ele pelo email graciliano.rocha@buzzfeed.com.
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