Quem assinava como jornalista responsável pelo "Resistência" era o livreiro Raimundo Jinkings, jornalista profissional, militante e dirigente do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Na condição de bancário do Banco da Amazônia, Jinkings foi vítima de perseguição política, logo após o golpe militar de 1964. Demitido do banco, ele montou uma pequena livraria na cidade, que aos poucos foi crescendo e se tornou uma grande referência, uma espécie de ponto de encontro da intelectualidade paraense.
Ali se encontrava o que era permitido pela censura, como também os livros que estavam na lista negra do regime. Homem calmo e de bom diálogo, Jinkings conseguia ter entre seus clientes até militares tidos como da linha dura do regime. Jinkings foi anistiado e voltou ao Banco até se aposentar, o que ocorreu poucos anos depois. Tinha também uma intensa militância no Sindicato dos Jornalistas.
Jinkings foi vice-presidente da SDDH e escrevia, com freqüência, artigos para o Resistência. Foi militante ativo do núcleo pela anistia da SDDH e por isso mesmo pagou caro quando a entidade decidiu promover um debate com Miguel Arraes, ex-governador pernambucano, preso e perseguido político, que retornara do exílio poucos meses antes.
Véspera da chegada de Arraes a Belém, a porta da igreja de Nossa Senhora Aparecida (onde funcionava a SDDH) amanheceu pichada com a frase CCC (Comando de Caça aos Comunistas) e a vidraça da Livraria Jinkings fora alvejada por um tiro de pistola, além de também pichada com a aterrorizante inscrição. O mesmo aconteceu na casa do presidente da SDDH, o economista Jaime Teixeira.
As páginas do Resistência tratavam da luta dos oprimidos e denunciavam as falcatruas em torno do controle da terra e da violência. Um bom exemplo é o que relata o jornalista Walter Rodrigues, com a matéria “Supergrilagem no Maranhão: de uma só vez, 2,3 milhões de hectares”:
No final do ano passado, o engenheiro K. Maia Neto, diretor
Assustado, o engenheiro pediu detalhes e só então ficou sabendo que estivera em vias de se tornar “proprietário” de uma parte da gleba Iguana, a maior grilagem já realizada no Brasil, totalizando, segundo os primeiros levantamentos, pelo menos 2,3 milhões de hectares, área correspondente a 8 por cento do Estado do Maranhão, igual à da República de El Salvador e maior que o Estado de Sergipe.[1]
A preocupação em resgatar a memória sempre esteve presente na linha editorial do Resistência. O objetivo era mostrar, às novas lideranças, os crimes da ditadura militar e os sofrimentos impostos aos que divergiam do regime. Na edição nº
Cresce a divergência
No final de 1981 foi lançada uma campanha de assinaturas do Resistência. O objetivo era ampliar a circulação do jornal, já que, àquela altura, a conjuntura política permitia que os dirigentes da SDDH utilizassem os serviços da Empresa Brasileira de Correios, apesar de todas as estatais contarem com uma Assessoria de Informação e Segurança (ASI). As pressões da sociedade levaram os generais a repensar uma nova estratégia de dominação e de manutenção do regime. As eleições para a Presidência da República permaneciam suspensas, mas a distensão, lenta e gradual, do general Geisel, cumprira o papel de preparar a chegada ao poder do general João Batista Figueiredo, que foi obrigado a ampliar o programa de abertura do regime, com a convocação das eleições para governador.
As divergências políticas dentro da SDDH se ampliam. A tentativa de conter as vitórias do MDB leva a ditadura a decretar o fim dos dois partidos (Arena e MDB) e permite a pluralidade partidária, uma velha bandeira dos que lutavam pelas liberdades democráticas. Muitos dos que pertenciam aos partidos clandestinos, como PCB e PC do B, vão disputar espaço no agora PMDB. E alguns foram para o Partido dos Trabalhadores, que surge no rastro das lutas operárias e sindicais, que eclodem a partir de 1978.
O debate ideológico começa a se travar nas páginas do Resistência. Além do inimigo principal, a discussão, às vezes, se torna azeda entre os que militavam em partidos legais diferentes. Mas o jornal prossegue dando ampla cobertura à denúncia sobre a prisão de dois padres franceses e 13 posseiros do Araguaia. Emerge também a figura de Sebastião Curió, homem do Serviço Nacional de Segurança (SNI) que montou um esquema de infiltração entre os camponeses para coletar informações sobre os guerrilheiros do PC do B, que organizaram e dirigiram a Guerrilha do Araguaia[3], cujo processo começou em 1966 e terminou em 1975.
[1] Publicado na edição nº 23 do Resistência, de abril de 1981.
[2] Foi anistiado, voltou a ocupar um cargo público em 1983. Depois foi deputado federal É autor, entre outros, do livro “Verde Vagomundo”, seu primeiro romance.
[3] Portela, Fernando. Guerra de Guerrilhas no Brasil. São Paulo: Global Editora, 1986.
Texto: Paulo Roberto FERREIRA, jornalista, Belém, Pará.
Um comentário:
Muito bom essas matérias sobre a nossa história parabéns,a equipe do blog.
carlos martins
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