segunda-feira, 7 de março de 2016

Gilberto Carvalho: "O Dr. Sergio Moro, tem uma necessidade de provar que os agentes do PT formam uma quadrilha e que o capo dessa quadrilha, que antes era o José Dirceu, agora é o presidente Lula..."

Lava Jato se transformou em instrumento de perseguição, diz Gilberto Carvalho


Jornal GGN - Gilberto Carvalho, ex-ministro do governo Dilma, afirma que a condução coercitiva do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva na última sexta-feira foi "totalmente desnecessária", já que Lula nunca se negou a depor e compara com outro ex-presidente, Fernando Henrique Cardoso: "a PF foi colher em sua casa o depoimento dele gentilmente e discretamente em um processo no qual ele é citado como testemunha". Para Carvalho, a Lava Jato foi invadida por uma concepção ideológica e política e acabou se transformando em um instrumento de perseguição.

Em entrevista para a Folha de S. Paulo, Carvalho disse que tanto os procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato quanto o juiz Sergio Moro tem a necessidade de provar que os agentes do PT formam uma quadrilha, e que Lula seria o chefe da quadrilha. O ex-ministro também critica a utilização enviesada das delações premiadas, reconhece que o PT errou ao não combater o fnanciamento empresarial de campanhas eleitorais. Também afirma que uma eventual prisão de Lula seria brincar com fogo e diz não acreditar no sucesso do impeachment contra Dilma Rousseff. Leia mais abaixo:

Enviado por Makário

Da Folha

Eventual prisão de Lula seria brincar com fogo, diz Gilberto Carvalho

Na última quinta-feira (3), véspera da Operação Aletheia, Lula fez um desabafo premonitório ao amigo petista Gilberto Carvalho.

"Eu vou ser preso ou vão fazer a minha condução coercitiva porque, do contrário, a Lava Jato não tem sentido."

A conversa sintetiza a percepção do partido de que a maior investigação das últimas décadas busca fazer "justiçamento, não justiça".

"O doutor Sergio Moro tem uma necessidade de provar que os agentes do PT formam uma quadrilha e que o capo dessa quadrilha agora é o presidente Lula", disse ele.

Para Carvalho, a Lava Jato não tem provas contra Lula, tem teses. E prevê que, no pior caso, tentem prender o ex-presidente: "Não quero falar nessa hipótese. Espero que não brinquem com fogo".

Carvalho não acredita no sucesso do impeachment e duvida que Dilma Rousseff saia do PT. "Até porque a sobrevivência dela estaria muito ameaçada", avalia.

*

Folha - O Ministério Público diz que Lula obteve vantagem na Lava Jato. Daí a operação de sexta-feira (4).

Gilberto Carvalho - Foi uma operação totalmente desnecessária, uma violência gratuita. O presidente Lula nunca se negou a depor. Podiam ter feito com ele o que fizeram com o presidente Fernando Henrique, em que a PF foi colher em sua casa o depoimento dele gentilmente e discretamente em um processo no qual ele é citado como testemunha. Eu só posso entender que o que aconteceu na sexta foi motivado por um processo que, a meu juízo, está tirando os méritos que poderíamos ter na Lava Jato, porque ela surge como uma ação importante de combate à corrupção. Mas, à medida que ela é invadida por uma concepção ideológica e política por parte de seus principais agentes, vai se tornando um instrumento de perseguição política.

A Lava Jato se politizou?

O problema acontece quando, numa investigação criminal, se abandonam os princípios que regem uma investigação científica. Os procuradores e, ao que tudo indica, o Dr. Sergio Moro, tem uma necessidade de provar que os agentes do PT formam uma quadrilha e que o capo dessa quadrilha, que antes era o José Dirceu, agora é o presidente Lula. Mas, ao invés dos fatos, dão base a uma tese pronta. Aí eles constrangem os fatos. Aquela entrevista coletivadada na sexta em Curitiba, particularmente a participação do Dr. Carlos Fernando [procurador da Lava Jato], deve ficar gravada para a história como a demonstração mais cabal do que eu estou dizendo. O tempo todo ele ficou pré-julgando. Ele não pode fazer isso! Ele não pode dizer que não houve palestras antes de levantar os fatos.

Você diz que a PF esteve na casa do FHC no mesmo dia da condução coercitiva do Lula?
Li no Brasil 247 que sim.

Você diz que o procurador não tinha elementos para dizer o que disse?
É isso. Porque, antes da investigação e da verificação dos fatos, ele já trabalha com a tese de que tudo aquilo que apareceu até agora está amarrado por uma quadrilha que busca dinheiro a qualquer preço, e que as palestras, por exemplo, não passam de desculpas para que Lula obtivesse dinheiro. Ele agiu como um julgador, sem nenhuma serenidade. Qual a tese de que eles estabeleceram previamente? Que o dinheiro da Petrobras é roubado pelas empresas coordenadas pela quadrilha do PT e que, a partir daí, o dinheiro que elas roubaram irrigou as campanhas eleitorais, deram um apartamento para o Lula, fizeram uma chácara para ele. Essa é a tese. Eles vão ter que provar isso. Não tem nenhuma disso! Até porque, pela história do país, os cartéis que se formam entre as empresas, e a maneira que elas corrompem os agentes públicos, não é por comando político. O problema político aparece em virtude do financiamento de campanhas, que todos os partidos praticaram.

Mas não há muitas acusações nas delações premiadas.
Nas delações premiadas, só interessam delações contra o PT, porque é preciso provar que aquele dinheiro é contaminado. O dinheiro que foi para o Aécio e o que foi para a Marina Silva não tem essa contaminação. Ele sai do mesmo cofre, da mesma fonte, mas como não estavam no governo, não determinaram o assalto à Petrobras. Isso é uma loucura.

Por que?
As empresas obtiveram o recurso, lícito ou escuso. Quando o Edinho Silva [ministro da Secom e ex-tesoureiro de Dilma] pediu dinheiro para a Andrade Gutierrez ou para Camargo Corrêa, fez o mesmo que o tesoureiro da campanha do Aécio ou da Marina. O Edinho não condicionou a uma sonda ou a uma obra. O dinheiro tem a mesma origem.

Mas isso não exime o dolo.
Vou insistir. O problema da delação premiada é que a pessoa é constrangida pelo inquiridor a dizer aquilo que o agrada porque está na mão dele a liberdade do delator. O advogado também tem o papel de convencer o seu cliente a fazer a delação para buscar a liberdade do seu cliente.

Tudo empurra para a delação. Mas não é preciso haver prova?
O problema da Lava Jato, e é preciso que se diga em alto e bom som, é que os campeões da corrupção estão soltos, tendo as suas penas reduzidas escandalosamente e tendo devolvido pequenas quantias daquilo que eles são acusados de ter se apropriado. Quem está ficando na cadeia em Curitiba é o Marcelo Odebrecht, que se negou a fazer delação, e os políticos. Isso é combate à corrupção? Isso tem de ser denunciado. O povo está se iludindo, achando que a Lava Jato está fazendo um processo importantíssimo de combate à corrupção.

Isso não exime o PT de tudo?
Eu sei que o PT errou, nós temos de reconhecer que errou. Além de não combater o financiamento empresarial, meteu-se a cometer erros através de várias pessoas, que se locupletaram. Não quero de maneira nenhuma negar isso. O problema é que quem criou isso, o mecanismo de financiamento empresarial de campanhas, não foi o PT. O mecanismo de financiamento empresarial de campanha é o mesmo para todos os partidos maiores. E todas as empresas doaram para ficar bem com os governantes. Isso precisa ser dito. O que as empresas fazem, na verdade, é uma espécie de investimento para não terem problema com o governante. Então, se nós queremos extirpar o câncer da corrupção, não se pode acusar primeiro, vazar criminosamente em seguida e expor Lula como ele foi exposto e só depois vem um julgamento. E quando for provado que as palestras foram pagas e efetivamente dadas? E quando for mostrado que não tem nada a ver o trabalho que a Odebrecht fez lá em Atibaia com a Petrobras? Aí será tarde. Estão criando no Brasil uma espécie de neofascismo. Pois não estão fazendo justiça, estão fazendo justiçamento. O clima que está no Brasil agora, e estou muito preocupado, é que estamos fazendo um acirramento de ânimos, onde não importa o devido processo legal. Isso leva a uma violência cada vez maior e fragilizará as nossas instituições. E o algoz de hoje pode ser a vítima de amanhã. Hoje é o PT que está exposto na praça pública, que virou a Geni, e que atiram pedras. Amanhã pode ser um outro partido se não se tomar os cuidados necessários. Esse é um papel que a mídia tem de chamar para si e assumir responsabilidade.

E quem é responsável por essa perseguição ao PT?
Estou falando de um setor da Polícia Federal, de um setor do Ministério Público. Estou falando da ação dirigida do juiz Moro.

Você tem algum indício de vínculo do Moro com algum partido político?
Em defesa do José Eduardo Cardozo –que era muito acusado de não controlar os excessos da Polícia Federal–, é disso que se tratavam as broncas que o Zé Eduardo levava, não era a atuação objetiva da polícia, que era necessária, mas esse conchavo com um tipo de imprensa e com os vazamentos. Não é assim. A Polícia Federal não é controlada pelo PSDB. Esses rapazes que estão hoje na PF e no MP são formadas numa geração profundamente marcada por um antipetismo. Eles cresceram, são jovens em geral, em famílias que hoje estão batendo panela. Foi se desenvolvendo nesses setores uma convicção de que bater no PT é bom para o país. Eu fui interrogado por dois delegados da Polícia Federal, eu pedi para conversar com eles fora do processo e me dei conta disso. São pessoas honestas, são sérias, não são bandidos e nem são instrumentos na mão da oposição. Não é rastaquera assim. Veja a ironia da história. Até 2002, você sabe o que acontecia no Ministério Público Federal. Por que não foi feito uma investigação mais profunda da compra de votos do Fernando Henrique e em torno da privatização? O Dr. Gurgel, ex-procurador-Geral da República, disse numa entrevista recente que Fernando Henrique não queria ser incomodado, por isso colocou um cara que não deixava nada andar. Ele tinha o controle rigoroso da PF, que centralizava qualquer investigação. Quando Lula tomou posse, muita gente tentou indicar nomes próximos a nós, mas o Lula decidiu que indicaria o primeiro da lista.

E houve reação na época?
Exatamente. Mas Lula bancou o primeiro da lista. Nos anos subsequentes, quando saiu Fontelles e entrou o Antônio Fernando, que faz a denúncia do mensalão, houve uma forte pressão para que ele rompesse essa lógica do primeiro da lista. Mas ele reconduziu Antonio Fernando. Depois, aconteceu a mesma coisa com o Gurgel. Mas não se rompeu essa tradição. Então, o que se esperaria do Ministério Público? Essa responsabilidade. O máximo de equilíbrio. No caso da polícia federal aconteceu a mesma coisa. Descentralizamos as investigações. Tanto que o Lula sempre dizia: daqui pra frente, quem não quiser ser investigado no governo, que não erre. Doa quem doer. Eu me lembro da nossa dor quando o José Dirceu, o [Antonio] Palocci foram investigados. Lula disse 'eu sinto muito'. Esse delegado que me inquiriu começou na Polícia Federal em 1998 e se tornou delegado em 2002. Ele não conhece o período anterior. Esse menino não tem a maturidade de não fazer loucuras como essa de sexta. Na sexta, quem saiu prejudicado e quem vai se desgastar no médio prazo não é o Lula, e sim essas instituições. Porque é muito ruim para nós que a Polícia Federal comece a ser utilizada para atender esse ou aquele tipo de pressão. Aí se faz um complô da investigação e do vazamento pra imprensa. Isso neste momento prejudica o PT, é verdade. Mas é ruim para a democracia. Esse procurador Carlos Fernando, que hoje brilha e foi receber as palmas sexta à noite, a história o terá como Calabar, como alguém que perseguiu uma pessoa que só fez bem ao país. Essa glória momentânea inebria essas pessoas e elas vão na linha da irresponsabilidade. Isso que, aparentemente, é muito bom, porque é o tal do julgamento imediato sem o contraditório, vai fazer mal mais para essas instituições do que para o PT no longo prazo.

Nos últimos meses, Lula passou por um desgaste muito grande e ficou fragilizado, mas não deu uma palavra sobre o seu caso. Ele parecia acuado. Por que ele demorou tanto para falar? Por que precisou de uma condução coercitiva para falar e ainda assim não explicou o que deveria explicar?
Eu concordo com a tese de que o Lula deveria ter falado antes. Acontece que em certos acontecimentos você precisa ter muita certeza do que você vai falar. Lula não estava a par de muitas das coisas da qual era acusado.

Como o quê, por exemplo?
Na história da chácara, o Lula não acompanhou em detalhes o processo de aquisição feito pelos amigos, nem sobre a reforma. Ele estava no governo e nós estávamos pressionando Lula a partir do penúltimo ano para que ele desse um destino para os bens que ele recebia no governo. O Lula, de longe, é o presidente que mais recebeu presentes e o acervo é imenso. Nossa preocupação era de como ia ser tratar aquele acervo porque o certo era ter uma fundação que tivesse condições de pegar todo esse material de todos os ex-presidentes e que faz parte da história do Brasil e colocasse no mesmo lugar. Só que a legislação diz que isso pertence ao ex-presidente e é de interesse público mas de propriedade privada. O que fez o Fernando Henrique? Ele pegou empresas e pediu doação para fazer o Instituto FHC. O Lula fez um Instituto Lula e pensava em construir um memorial da democracia. Nós estávamos fazendo essa pressão. Da mesma forma, a família estava pressionando para que ele tivesse algum espaço de descanso após a Presidência, mas ele dizia que discutiria isso depois. Foi nesse contexto que surge uma história de algum amigo comprar um espaço onde ele pudesse descansar e eventualmente guardar os presentes da Presidência. Foi aí que esses amigos tomaram uma iniciativa. Só que ele não foi informado adequadamente e no tempo certo de todo esse processo.

Mas ele não teve curiosidade para saber quem tocou a compra? Dona Marisa?
Foi um pool de amigos. Se ele teve curiosidade depois, eu não sei, não acompanhei. Houve um embaraço da parte dele, que eu concordo que não foi positivo, para poder dar uma explicação cabal de dizer que a chácara tinha sido comprada e mostrar os recibos. Foi feito uma reforma e alguém teve a ideia de pedir para um construtora ajudar para acelerar o processo, porque estava chegando o fim do ano e queriam dar esse presente para ele ter um lugar para descansar.

Quando Lula toma conhecimento de como foi toda operação, ele fica constrangido de admitir que tinha recebido presentes, é isso?
Primeiro porque ele não sabia quem tinha participado efetivamente, não era uma coisa explicitada na época. O negócio da torre da Oi eu nem sei, não posso falar, mas o da reforma, que teve a participação da Odebrecht, não foi o Lula que pediu. Até porque, é bom lembrar que, em 2010 e em 2011, não tinha a Lava Jato e não tinha essa conotação. E o Lula estava saindo do governo.

Mas quando as obras começaram o Lula ainda estava no governo.
Pois é, mas ele não estava participando dessa história, pois quiseram fazer uma surpresa pra ele. Eu concordo que faltou rapidez na resposta e concordo também que não foi adequado envolver uma empresa nessa questão. Agora, o que não pode é estabelecer esse nexo causal de crime entre a Petrobras e uma obra de reforma de um lago e de uma casa em Atibaia porque, se ele quisesse acumular dinheiro, ele teria feito como outros fizeram e não fez. O Lula passou a ganhar dinheiro fazendo palestras depois da Presidência. Qualquer empresa no Brasil e no exterior queria ouvi-lo. Não faz sentido, é ridículo. Ele que foi tão rigoroso com a gente, não se sujaria.

Não é inverossímil ele ir ao sítio pela primeira vez e não perguntar de onde veio? Não dá para dizer que ele não sabia.
Eu não posso dizer isso. Eu só disse que eu não acompanhei esse processo.

Ele tinha intenção de adquirir o sítio mais tarde?
Não tenho certeza, mas acho que seria provável.

E o tríplex?
Ele tinha comprado um apartamento lá atrás, aí a OAS quis inventar de fazer uma puta de uma melhora naquele apartamento para oferecer para ele como uma valorização daquele móvel. Ele me contou que foi lá um dia para ver se fechava o negócio ou não. A OAS queria agradá-lo, mas ele chega lá, olha pro mar, e diz: "isso aqui seria uma prisão, uma torre de marfim pra mim, uma prisão, eu nunca poderei atravessar a rua e ir para essa praia. Não quero", disse para Marisa. E o negócio não foi feito, graças a Deus, diga-se de passagem. Então, no caso do tríplex, é mais fácil a explicação porque não tem nada que vá comprovar essa acusação. É como se um cara me oferecesse um imóvel e me desse uma puta arrumada no imóvel para me agradar e eu chego lá e desisto de fazer, de exercer o direito de comprar. A chácara está em nome do Fernando e do Jonas e não tem nada que prove a acusação de que não são deles. Parte do acervo foi pra lá. Pelo amor de Deus, os dois pedalinhos, não vou nem comentar.

O Lula estava deixando de ser funcionário público e, ainda que ele não soubesse da operação do presente da casa, o transporte dos presentes da Presidência que foi pago por uma empreiteira também.
Mas o Lula não era mais presidente. Esse material saiu do Planalto e do Alvorada quando ele já era ex-presidente.

Ele não era mais presidente, mas era um quadro político com extrema influência sobre o novo governo. Afinal de contas, ele tinha eleito Dilma Rousseff. Não tem empresa nem no Brasil nem no mundo que agrade sem um interesse. Portanto, a empresa era movida por interesse e Lula aceitou.
Se ele tivesse aceito um tipo de presente dessa natureza como presidente da República, eu ficaria muito mal com ele, seria antiético. Agora, ele não sendo mais presidente, eu não posso pessoalmente, no meu critério, dizer que não acho legal, Ele pode ser influente o resto da vida, e vai passar o resto da vida sem poder receber nenhum tipo de presente? Eu não posso impor a ele aquilo que a lei permite. Se a lei dissesse que ex-presidente não pode aceitar nenhum tipo de presente, tudo bem. Mas a lei permite. O que a lei não lhe proíbe, não posso ter um padrão de exigência subjetivo meu para dizer "não, você não pode, porque você é ex-presidente e porque talvez você pudesse influenciar a Dilma".

O Lula foi conduzido até a polícia e você diz que a polícia foi até o Fernando Henrique? Não vi isso.
Eu li num blog ontem que trazia uma ata da PF mostrando isso, que a polícia foi até a casa do Fernando Henrique para colher o depoimento dele. Não estou reclamando que fizeram isso, eu estou achando que podiam ter feito com Lula o que eles já fizeram em outras condições. Mandaram uma comunicação e se combinou a data do depoimento.

Mas ele demorou sete meses para isso acontecer.
Um deles pode ser verdade, ter demorado mais, mas, no segundo, não, no segundo ele foi quando foi chamado. Eu não estou reclamando tratamento especial para ele, não. O ministro Marco Aurélio [STF] foi muito claro quando disse que a condução coercitiva é quando o investigado se recusa a se apresentar.

É uma diferença gritante de tratamento entre Lula e FHC! Uma diferença gritante que pede uma explicação. Tudo bem que o Fernando Henrique era chamado como testemunha, mas tinha que ter dado uma isonomia não só em relação a Fernando Henrique mas a qualquer cidadão. O que eles fizeram com o Fernando Henrique, a meu juízo, é correto, pois não o constrangeram e não expuseram publicamente. Fizeram uma gentileza pelo fato de ele ser ex-presidente da República. Eu nem estou dizendo que a polícia precisava ir na casa do Lula, era só fazer uma intimação e o Lula compareceria. Porque não fizeram com Lula isso? Vou te falar uma frase que o Lula me disse na quinta: 'Gilbertinho, põe na tua cabeça. Eu vou ser preso ou vão fazer a minha condução coercitiva porque, do contrário, a Lava Jato não tem sentido. Ela foi moldada nessa perspectiva. Então, Gilbertinho, tire da cabeça que eu não sofrerei algum tipo de constrangimento porque eles fizeram tudo isso para chegar a mim. Então, não tem como eu não ser levado'. Eu só não imaginava que isso seria no dia seguinte.

Isso foi na véspera da Operação?
Um dia antes. Passei no Instituto para me reunir com Luiz Dulci sobre uma questão do movimento sindical para combater o desemprego, e o Lula estava lá. Tomei um café rápido com ele e perguntei como ele estava e tocamos na Lava Jato.

Existia no começo da Lava Jato uma máxima de que não teriam coragem de levar Lula preso. A operação de sexta parece ter derrubado essa máxima. O que veremos o que nos próximos dias nas ruas?
Eu não quero falar nesse hipótese, espero sinceramente que não aconteça. Eu só espero que eles não brinquem com fogo. A tese que eles desenvolveram é a tese de que o Lula é uma estátua de gelo, que basta você encostar perto do fogo que ela vai derreter. Essa foi a tese que eles seguiram, na expressão de um cara deles, que eu fiquei sabendo. Então, eles tentaram desmoralizar o Lula, primeiro isolando-o da massa para depois chegar nele. Na sexta ficou evidente que isso não é tão simples assim. Mas o problema não é esse. A polícia não pode ser conduzida pelo princípio de que eu prendo ou não prendo pelo que ele fez ou deixou de fazer, mas sim pelo medo que eu tenho de uma convulsão. Isso é um absurdo. Espero que haja o bom-senso e de que a Lava Jato volte ao seu leito natural de combater a corrupção real e deixe de fazer teatro, que as delações premiadas deixem de ser instrumento de perseguição de parte de um partido político. E digo mais, se a delação da Andrade Gutierrez for direcionada apenas contra o PT, esse escândalo vai ser insuportável, porque vai ser a confissão final de que a lava jato é dirigida contra o PT. Pois todo mundo sabe que a Andrade Gutierrez é a casa do senhor Aécio Neves, é quem banca o Aécio. Então, se houver isso, vai ser uma loucura. Por isso espero que volte a ser um instrumento de combate à corrupção. Esperamos que cessem os vazamentos criminosos e a espetacularização. Queremos uma investigação séria, científica, sem preconceito. Não pode isso de que o cara roubou, conta duas ou três coisas e é perdoado no tempo de prisão e na questão financeira. É esse o combate à corrupção que nós vamos ter no país? Não pode, eu não quero acreditar nisso.

O que acua mais o PT, a Lava Jato ou a economia?
O povo está preocupado com emprego. Eu começo a ver o fastio das pessoas. Eu não esqueço quando, no mensalão, cheguei no meu gabinete e Lula estava lá, sentado esperando. Quando entrei, ele me deu um abraço e disse: "Gilbertinho, eu vou viajar, quero que você ponha na cabeção uma coisa: o que eles querem é que a gente pare de trabalhar. Vamos trabalhar, vamos fazer economia crescer, pois quando passar esta espuma, o povo vai perceber que nós trabalhamos e que a vida do povo começou a melhorar, o resto desaparece". Foi o que aconteceu. Agora eu digo a mesma coisa. O problema principal da Lava Jato é que ela está prejudicando profundamente a economia. O que eu acho que é pior pra nós, de fato, é a economia. Porque se a economia voltar, tiver respiro de crescimento, a Lava Jato vai ficar no seu lugar. O que preocupa é muito mais a economia, mais do que a Lava Jato.

Todos os relatos das pessoas do grande e do baixo clero que trabalham no governo são de que o governo está completamente paralisado. O governo Dilma não consegue se desvencilhar da paralisação. Parece que parou.
Eu te confesso que essa é a minha preocupação central. Eu não estou no governo, eu não tenho elementos para avaliar, mas o que mais me preocupa, de longe, é esta questão da economia. Eu penso que nós precisamos trabalhar e isso é muito difícil porque este clima não ajuda em nada. Tem que ter um processo de repactuação neste sentido ou vamos entrar num processo gravíssimo para o país.

Você diz repactuar com qual agenda?
Com o mundo empresarial, com o mundo político mesmo. Eu acho que é hora de chamar governadores e mesmo a oposição, e o governo deve propor. Porque, nesse caso, quem sinaliza uma proposição, um pacto, não é o mais fraco, é o mais nobre, é o que tem mais condição de ver que acima de tudo está o interesse do país. Precisamos salvar o essencial.

Você acha que a Dilma está livre do impeachment?
Eu não acredito na possibilidade do impeachment enquanto as instituições estiverem funcionando, porque eu não vejo base nenhuma para o impeachment, nem mesmo base para um julgamento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Eu acho que a Dilma vai até 2018. Eu não posso ser ingênuo e achar que o impeachment acabou. Acho que é um erro da oposição, porque ela não contribui, ela ajuda a fragilizar muito o governo. O governo tem que virar esta agenda. Quando você está muito sitiado é que precisa tomar uma iniciativa.

Foro privilegiado para ex-presidentes. Você acha que com o que aconteceu na sexta é o momento discutir isso?
Não. Acho que não.

Para não parecer casuísmo?
Não é para não parecer casuísmo. O foro privilegiado tem que pertencer a quem está exercendo algum mandato pra que ele não fique ao léu à disposição de qualquer juiz de primeira instância. Mas quem não está no governo não vê razão nenhuma para isso. O próprio Lula concorda porque nunca aceitou a hipótese de virar ministro para ter foro privilegiado. Eu não vejo razão.

O PT e a Dilma estão cada vez mais distantes e a presidente tem sido aconselhada a sair do PT. O que você acha disso?
A Dilma não vai sair do PT. Eu não consigo imaginar de maneira alguma isso. Não pode ser visto como uma crise. Se o partido discorda da política econômica do governo, está na opção dele, criticando. O governo recebe enorme pressão dos setores conservadores todos os dias. Se, do outro lado, não tiver ninguém pressionando, o governo vai ser cada vez mais conservador. Sempre fui favorável à pressão dos movimentos sociais porque é a forma que nós temos de equilibrar o governo. Os nossos ministros recebem todos os dias empresários, mas têm enorme dificuldade de receber movimentos sociais. Mesmo o governo Lula, mesmo o governo Dilma. Então, acho que está correto o partido fazer as críticas que têm que fazer. Elas têm que ser recebidas com naturalidade pelo governo, pela presidente, e o partido tem que entender que ele não pode querer mandar no governo, ele pode influenciar, mas ele não tem que mandar no governo. Então, eu não acho que a Dilma saia do do PT, até porque a sobrevivência dela estaria muito ameaçada se ela saísse do PT. Seria uma ilusão achar que ela faria o movimento feito por Marta Suplicy, que iria sobreviver apoiada por setores que só querem vê-la fora do governo. Acho que ela tem uma ligação com o presidente Lula que é muito mais profunda ainda.

O que acontece se a presidente não mudar sua agenda econômica?
Não quero pensar nessa hipótese. O conflito com o partido evidentemente se acentuaria. A base que a sustenta hoje não terá condição de segui-la sustentando, mesmo querendo. Os movimentos sociais demonstraram a maior maturidade nos últimos tempos na relação com o governo, pois mesmo tendo uma agenda absolutamente adversa, as iniciativas do governo nos últimos tempos têm sido quase toda contra os interesses da maioria dos trabalhadores. Os movimentos tiveram a maturidade de distinguir a crítica à política econômica do governo da necessidade de manter a legalidade e ser contra o impeachment. Daqui para frente, se continuar numa situação em que a economia vai mal e os direitos sociais, tolhidos, qual trabalhador ou sindicalista vai para porta de fábrica defender um governo com o índice de desemprego imenso? Qual morador, qual agente do movimento social de moradia vai poder defender se pararem os benefícios de moradia para o povo? Por isso que eu espero sinceramente que a presidente Dilma leve em conta a necessidade de buscar saídas na economia que retomem o investimento e o emprego.

Essa condução coercitiva do Lula levará a uma radicalização muito forte nas ruas?
Vai depender, a meu juízo, do comportamento da PF, do Ministério Público e do Judiciário. Se houver um reequilíbrio e ficar claro que a Lava Jato busca combater a corrupção, não o Lula, acho que a sociedade vai compreender. Mas, se continuar tão explicitamente como foi demonstrado na sexta e em outras ocasiões, esse direcionamento persecutório de uma força política de um líder, como é o caso do Lula, aí eu temo muito por um processo que nos leve ao que acontece na Venezuela, porque você vai levar ao processo de justiçamento, de justiça com as próprias mãos, e haverá um ódio progressivo. Não foi nada bom o que ocorreu na sexta, as manifestações à tarde. Estou convencido de que pode ocorrer no dia 13, mas temos que ter maturidade de não insuflar ou estimular esse tipo de manifestação. Temos de buscar o contrário, buscar o entendimento e a paz.


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