domingo, 28 de março de 2010

Diario de um Blogueiro: Grande imprensa golpeia a democracia

Jornalista e atual blogueiro Jadson Oliveira (Foto), 64 anos, trabalhou como jornalista, em diversos jornais e assessorias de comunicação, de 1974 a 2007, sempre em Salvador (Bahia). Na década de 70 militou no PCdoB e no movimento sindical bancário. Ao aposentar-se, em fevereiro/2007, começou a viajar pelo Brasil, América Latina e Caribe. Esteve em Cuba, Venezuela, Manaus, Belém/Ananindeua (quando do Fórum Social Mundial/2009) e Curitiba, com passagem por Palmas, Goiânia e Campo Grande. Depois Paraguai e Bolívia atualmente está em Trinidad e Tobago. Virou viajante e blogueiro. Clic aqui e acesse o blog do Jadson Oliveira.



"Jornal Nacional sonegou aos brasileiros a informação mais “quente” do noticiário político do dia: a última pesquisa da CNT/Sensus sobre a corrida presidencial indicava que a ministra Dilma Rousseff tinha empatado, tecnicamente, pela primeira vez, com o governador José Serra)".


Depois de dois anos de viagens pelo Brasil, América Latina e Caribe, tentando acompanhar os movimentos sociais e a política, me saltam na cabeça dois fenômenos:

1 – O protagonismo dos segmentos mais pobres da população no processo revolucionário de países como Venezuela e Bolívia, cujos governos hoje podem ser catalogados entre os mais progressistas da região, e onde já está em vigência o que podemos chamar de democracia participativa (por extensão, onde avança a luta em busca do socialismo por caminhos considerados não ortodoxos).

2 – A ação deliberada dos principais meios de comunicação - sob a tutela dos interesses do império estadunidense - para desqualificar tal processo e satanizar suas lideranças, em especial o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, hoje o mais destacado líder anti-imperialista nas Américas.

O fator determinante no avanço democrático é a participação ativa das maiorias mais pobres no dia-a-dia da política, o que resulta na aplicação de políticas públicas de inclusão social e de freios ao apetite insaciável dos conglomerados transnacionais. Quer dizer, as maiorias dos dois países acima (e outros, poderíamos acrescentar, por exemplo, Equador e Nicaragua) conseguiram ultrapassar a fase da democracia apenas representativa, na qual o povo é convocado somente para votar e escolher seu presidente periodicamente. Os movimentos sociais raramente vão às ruas defender os interesses das camadas mais esquecidas e injustiçadas e, quando vão, não logram mobilizações significativas.

O que se vê em Caracas e La Paz é a presença quase diária de manifestações de rua, passeatas, ruas “trancadas”, promovidas pelos mais diversos segmentos sociais. Uma vez, na Bolívia, escrevi um artigo me perguntando “com quantas ‘marchas’ e ‘bloqueos’ se faz uma democracia participativa”.

Este critério – a participação direta do povo no dia-a-dia da política – é o básico, na minha opinião, para identificar o grau de democracia de um país. Em consequência, o grau de avanços em favor dos trabalhadores e dos mais “fracos”, como o povo costuma chamar os pobres. Ou ao contrário: o grau de assaltos às riquezas nacionais perpetrados pelos mais ricos.

Mas os critérios da chamada grande imprensa são outros. O básico é identificar se tais políticas e tais governos ameaçam ou não os ganhos das grandes empresas transnacionais, que insistem em governar o mundo, mesmo que os eleitores de qualquer país nunca tenham sido consultados neste sentido. Hugo Chávez é tratado pela maioria dos órgãos de comunicação do Brasil como “ditador”, como “truculento”, embora nos seus 11 anos de presidência tenha enfrentado 12 eleições: ganhou 11 e perdeu uma. Evo Morales, que é menos atacado que seu aliado Chávez, mas volta e meia é referido como “totalitário”, enfrentou cinco eleições a partir de 2005, quando foi eleito presidente da Bolívia: ganhou todas.

Aliás, o professor norte-americano Noan Chomsky, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, sigla em inglês), disse em recente entrevista que os comentários elogiosos do presidente Lula sobre Chávez e Morales não são publicados pela imprensa dos Estados Unidos, porque os dois não são considerados modelo (modelo do agrado do império, evidentemente).

Só para ilustrar: no Jornal Nacional, da TV Globo, no dia primeiro de fevereiro, foi noticiado que a oposição venezuelana divulgou um manifesto pedindo o afastamento de Chávez, alegando que após 11 anos de governo ele já teria demonstrado cabalmente sua incapacidade para resolver os problemas do país, etc, etc. Entretanto, o JN sonegou aos seus milhares de telespectadores a resposta do presidente: se a oposição quer o seu afastamento, é só apelar para o referendo revogatório, um dispositivo que está lá na Constituição (dispositivo existente apenas em constituições das democracias mais avançadas), pelo qual os eleitores podem dizer, a qualquer altura do mandato, se o presidente continua ou sai.

(Na mesma noite, o mesmo Jornal Nacional sonegou aos brasileiros a informação mais “quente” do noticiário político do dia: a última pesquisa da CNT/Sensus sobre a corrida presidencial indicava que a ministra Dilma Rousseff tinha empatado, tecnicamente, pela primeira vez, com o governador José Serra).

Ainda bem que temos os diversos blogs/sítios/sites na Internet, algumas rádios e TVs comunitárias, a imprensa sindical e alguns órgãos de comunicação que tentam contrabalançar, de alguma forma, os monopólios da mídia brasileira. O povo tem o direito a informar e não apenas a ser informado.

(Texto escrito em Salvador/Bahia/Brasil em fevereiro/2010).

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