Via Jota - Caso é a primeira crise envolvendo a gestão de Dias Toffoli no comando do STF
Ministro Ricardo Lewandowski e ministro Luiz Fux durante sessão do STF. Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Em uma decisão com fortes críticas internas, o ministro Ricardo Lewandowski reafirmou, nesta segunda-feira (1/10), autorização para que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva conceda entrevista da prisão para o jornal Folha de S.Paulo e para correspondente do El País.
O ministro aproveitou seu despacho na reclamação 32.035 para criticar o ministro Luiz Fux que concedeu liminar suspendendo a fala do petista para jornalistas e ainda o presidente da Corte, Dias Toffoli. “O presidente do Supremo, assim como o vice, não são órgãos jurisdicionais hierarquicamente superiores a nenhum dos demais ministros desta Corte”, disparou.
Lewandowski chama o despacho de Fux de questionável e sustenta que o entendimento do colega “não possui forma ou figura jurídica admissível no direito vigente, cumprindo-se salientar que o seu conteúdo é absolutamente inapto a produzir qualquer efeito no ordenamento legal.”
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O ministro ainda coloca em dúvida o fato de o pedido de liminar ter sido analisado por Fux e não por Dias Toffoli. “Que a estratégia processual, a qual redundou na decisão aqui atacada, inteiramente tisnada por vícios insanáveis, foi arquitetada com o propósito de obstar, com motivações cujo caráter subalterno salta aos olhos, a liberdade de imprensa constitucionalmente assegurada a um dos mais prestigiosos órgãos da imprensa nacional.”
“Dessa forma, é forçoso concluir que a teratológica decisão proferida nos autos da SL 1.178 é nula de pleno direito, pois vai de encontro à garantia constitucional da liberdade de imprensa e, além de afrontar as regras processuais vigentes, desrespeita todos os Ministros do Supremo Tribunal Federal ao ignorar a inexistência de hierarquia jurisdicional entre seus membros e a missão institucional da Corte”, completou.
“Reafirmo a autoridade e vigência da decisão que proferi na presente Reclamação para determinar que seja franqueado, incontinenti, ao reclamante e à respectiva equipe técnica, acompanhada dos equipamentos necessários à captação de áudio, vídeo e fotojornalismo, o acesso ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a fim de que possam entrevistá-lo, caso seja de seu interesse, sob pena de configuração de crime de desobediência, com o imediato acionamento do Ministério Público para as providência cabíveis, servindo a presente decisão como mandado”, escreveu o ministro.
Lewandowski chega a listar oito erros na decisão de Fux: 1) não cabe Suspensão de Liminar contra decisão de Ministro do Supremo Tribunal Federal; 2) é inadmissível a revisão de decisão de mérito de reclamação por meio de Suspensão de Liminar; 3) partido político não é parte ilegítima para ajuizar a Suspensão de Liminar; 4) a Suspensão de Liminar é incompatível com o objeto da Reclamação; 5) ocorrência de flagrante usurpação de competência do presidente do Supremo Tribunal Federal; 6) inexistência de hierarquia entre Ministros da Suprema Corte; 7) competência exclusiva das Turmas e não do Plenário para a apreciação dos recursos das Reclamações julgadas monocraticamente; e 8) inocorrência de previsão regimental ou legal para ratificação de decisão do Presidente pelo plenário da Corte em Suspensão de Liminar.
Lewandowski colocou em dúvida o motivo de Fux estar no exercício da Presidência. Chamou a decisão de “questionada e questionável”. “Destarte, desprezando-se o fato de que o presidente do Supremo Tribunal Federal encontrava-se no território nacional, mais precisamente na cidade de São Paulo (conforme consta da anotação de sua agenda oficial), e, portanto, com poderes jurisdicionais para apreciar a medida, inclusive por meio eletrônico, como é habitual, bem como a circunstância de que o vice-Presidente também estava fora da Capital Federal, em pouco mais de uma hora depois da distribuição da Suspensão da Liminar, os autos foram surpreendentemente remetidos ao ministro Luiz Fux que, em cerca de uma hora após seu recebimento, proferiu a decisão questionada e questionável.”
Conversa
A nova posição de Lewandowski ocorre depois de breve encontro reservado com o presidente do STF, Dias Toffoli, na manhã desta segunda-feira (1/10) em São Paulo, durante o evento “30 Anos da Constituição Federal de 1988”, organizado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). De acordo com interlocutores, os dois tiveram uma reunião tensa, quando Lewandowski reclamou da postura dos colegas. A ideia de Lewandowski é não levar o caso ao plenário da Corte e chegou a avisar a Toffoli, que usaria um tom ríspido em eventual julgamento para questionar juridicamente o entendimento de Fux.
Lewandowksi atendeu pedido feito pelo jornal que classificou a decisão de Fux de “inaceitável e surpreendente ato de censura prévia que a Constituição proíbe”. “É manifestamente ilegal. Não pode prevalecer.”
O embate começou na sexta-feira (28/9) após Lewandowski autorizar o encontro de Lula com jornalistas, o que tinha sido proibido pela Vara de Execuções Penais do Paraná. O ministro afirmou que proibir Lula de falar e a Folha de entrevistá-lo representaria censura, sendo que no julgamento da ADPF 130, que discutiu a Lei de Imprensa, os ministros fixaram que o jornalista deve ter acesso à fonte da informação.
Horas depois, Luiz Fux, vice-presidente, concedeu uma liminar ao Partido Novo suspendendo o entendimento do colega. Fux alegou que a entrevista de Lula, que teve a candidatura barrada pelo Tribunal Superior Eleitoral, poderia causar confusão no período eleitoral “sugerindo que o requerido estivesse se apresentando como candidato ou praticando atos que lhe foram interditados”.
Até agora, o Supremo não esclareceu porque Fux assumiu a Presidência e cassou a liminar do colega, sendo que Toffoli estava em viagem para São Paulo.
Atropelos
Nos bastidores do Supremo, os dois ministros foram criticados por colegas, que viram falhas jurídica nos dois despachos. Em relação a Lewandowski, ministros disseram reservadamente que não haveria respaldo para ele liberar a entrevista dentro de uma ação constitucional que tratou de forma abstrata sobre a liberdade de imprensa. Na corte, há ministro defendendo que a questão cabe à Vara de Execuções Penais do Paraná, que é responsável pelo cumprimento da pena de Lula.
Sobre o entendimento de Fux, ministros afirmam que há questionamentos sobre a legitimidade do partido Novo para levar o caso ao Supremo, uma vez que caberia à PGR ou AGU recorrer da decisão que foi concedida em ação constitucional.
MÁRCIO FALCÃO – Editor em Brasília
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