Em primeiro lugar, o debate sobre a privatização da água perpassa pela reflexão acerca do que é “bem” e “mercadoria”, na lógica capitalista. A informação, a energia, assim também a água constitui-se em bens sociais indispensáveis à sobrevivência humana, logo, podem ser incluídos como componentes do direito natural que todo ser humano deve ter a sua disposição para suprir suas necessidades. Na lógica do capital estes “bens sociais” ao apresentarem elevada demanda de consumo transformam-se em mercadoria e tornam-se altamente lucrativos, sendo apropriado por grupos econômicos que disponibilizam para a sociedade em troca de um preço inacessível para a maioria da população.
É relevante considerar que a privatização do sistema telefônico no Brasil, assim como a energia elétrica, e a mineração, citando o exemplo CVRD, foi custeado com a injeção de recursos públicos, seja para oferecer toda a infra-estrutura para a operação e funcionamento das empresas, como também, para a composição dos grupos controladores por meio do BNDES. O capital não compra negócio falido, e em seus momentos de crise, citando 1929, 1973 e mais recente em 2008, o Estado como seu guardião, estendeu os braços para o soerguimento deste modo de produção e o capital especulativo.
Assim, a privatização dos “bens sociais” no Brasil trouxe mazelas que atualmente tornam o Estado inoperante para combater a pobreza, a miséria, a violência, a prostituição infantil, e outros fenômenos sociais que atingem tanto ricos quanto pobres. O poder nefasto da onda privatizadora no Brasil só elevou o lucro das empresas. No caso das telecomunicações a redução drástica dos postos de trabalhos e a demissão em massa dos trabalhadores de telecomunicações, contribui para a formação do caos social. Em contrapartida, o povão é ludibriado por taxas cobradas a 0,3 centavos de real por minuto, no entanto os balanços financeiros das operadoras revelam lucros atraentes, tornando a “comunicação e a informação” uma mercadoria altamente rentável a esses grupos econômicos.
No caso da energia elétrica, as privatizações mostram informações equivocadas. Basta analisar o exemplo da Ligth no Rio de Janeiro e da CELPA no Estado do Pará que estão devendo quase o seu CAPITAL SOCIAL. O programa que disponibiliza energia para o campo pós-privatização, hoje chamado de LUZ PARA TODOS, começou com recursos do Governo Federal, com a nomenclatura LUZ NO CAMPO, não é do governo do Pará, nem da CELPA. Toda a infra-estrutura necessária a distribuição de energia pela CELPA no Estado do Pará foi realizada pelo governo, logo, a Rede Celpa não investiu o suficiente para se afirmar que ele tem participação social no desenvolvimento regional.
O debate sobre a privatização da água vem amadurecendo em função dos interesses dos grupos econômicos que defendem a lógica de que todo “bem social” é passível de mercantilização, e assim, juntamente com a saúde, educação, segurança, previdência, essenciais a promoção de níveis de qualidade de vida e dignidade ao ser humano, somente tem acesso aqueles que podem dispor de recursos financeiros.
O debate da privatização da água perpassa pela questão ética relativa ao valor deste bem natural, indispensável à sobrevivência humana, de modo que é fundamental a mobilização de toda a sociedade paraense em torno da defesa dos interesses coletivos, sendo portanto gerenciado pelo Estado para atender a todos.
Vale lembrar que a empreitada de Lemos para o embelezamento da cidade de Belém realizou-se sob as influências do capital que aqui se instalara resultante da economia do ciclo da borracha, canalizando um sistema de abastecimento de água destinado a servir as elites concentradas nos bairros centrais. Além disso, a visão higienista imposta na cidade era um dos fatores para tornar Belém o centro de comercialização na região amazônica.
Portanto, discutir a operacionalidade de um sistema de abastecimento de água de uma cidade com elevados níveis de contradições sociais, é diminuto quando se aponta para a privatização como tábua de salvação.
Newton Pereira
3 comentários:
Parabéns Newton, execelente Artigo.
Senhor Newton, seu ponto de vista caminha na direção ao que propus em um comentário que fiz, ou seja, a questão carece de um aprofundamento maior. Considero legítimos seus argumentos, mas, vejo nele uma carga muito apelativa de acadêmicismo, e nem sempre a academia faz prevalecer o bem comum, acredito que devamos deixar de 'coisificar' a água, ou seja antes de ser "bem" ou "mercadoria" é algo indispensável à vida no planeta, logo se faz necessário olharmos para o futuro, como dos nossos descendentes, então, nossas atitudes tem que possuir um grande compromisso com a responsabilidade.
Quando proponho o debate, é que tenho minhas precauções quanto a capacidade gerencial do Estado, não conheço nenhum serviço essencial ao cidadão ser tratado pelo Estado pelo menos com respeito, ou devemos acreditar que a saúde, a educação e etc são gratuitas para o cidadão, sabemos que não, isto porque nós simples cidadãos, pagamos tudo antecipado por meio de uma carga tributária que ganha contorno de cgruel na medida em que não vemos o retorno adequado na forma de serviços essenciais ao bem comum.
Creio que devemos discutir com responsabilidade, despidos de qualquer sentimento de parcialidade.
Saudações
Mauro S. Almeida
Meu Caro Mauro,
Meus argumentos não são apenas “acadêmicismo”, mas fruto da minha vida de militante político que sou. Aceito o debate político, técnico e acadêmico. Hoje a formação plural do cidadão deve ser o ponto de partida para o debate da gestão pública.
Logo, a democratização em relação ao acesso a água contempla o atendimento das necessidades sociais, universalizando tal bem natural, portanto, de todos, para suprir as demandas relativas a sobrevivência humana.
A gestão de tal bem natural, portanto, social, pelo Estado ainda é a alternativa mais viável para manter a democratização do serviço de distribuição para todo cidadão. No entanto, você há de convir que a gestão estatal vem passando por reformas sucessivas, visando alcançar a transparência em suas ações e consequentemente elevar a qualidade dos serviços prestados à sociedade.
Não esqueça que o Estado pode avançar na gestão no momento em que a população se torna mais esclarecida de seus direitos e participa na operacionalização das ações. Assim, a reflexão sobre a gestão do Estado não comporta a privatização dos serviços essenciais ao atendimento das demandas da sociedade.
Precisamos ter um Estado mais eficiente, capaz de oferecer serviços públicos de qualidade para a população, e em relação a distribuição dos serviços de água implica num debate relativo a gestão compartilhada com a sociedade, sem necessariamente privatizar serviços.
Newton Pereira
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